segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Simbolismo - a vida dos sentidos

Tendo como base o texto de Paulo Leminski, elabore uma reflexão que articule o trecho citado com as características do Simbolismo, especialmente sobre a produção de Cruz e Sousa. Procure relacionar a produção de Cruz e Sousa (ao menos um poema) com a de outro poeta brasileiro, apresentando aproximações e diferenças [tanto no aspecto do estilo do autor quanto do estilo de época] entre as obras citadas.

"Poesia não é literatura. É outra coisa: é arte, mais para o lado da música e das artes plásticas, como Pound viu (ou ouviu) muito bem.
Da imprensa às vanguardas do início deste século, durante o período de sequestro da poesia pela literatura (na Idade Média, a lírica era oral, envolvendo canto, dança e festas, camponesas ou cortesãs;; os textos, raros, eram manuscritos, primores caligráficos de forma e cor; com a imprensa, a  poesia virou 'letra', na homogeneidade linear dos inodores, insípidos e incolores ABCS de Gutenberg; no século XX, com as vanguardas e a música popular, a poesia volta à vida dos sentidos, em forma, voz e cor), nesse período, algumas coisas ficaram dizendo que a poesia não era bem a literatura que estavam querendo fazer com ela. Entre essas coisas, a métrica. E, sobretudo, a rima. Nessas materialidades a poesia manteve sua individualidade. Não basta dizer. Tem que dizer bonito.
A métrica só se justifica pela presença de uma melodia, construída sobre a regularidade matemático-pitagórica da música.
A métrica, em poemas escritos para serem lidos no papel, é um absurdo: o olho não ouve a música. Ou ouve? Os simbolistas (a partir de Baudelaire) achavam que sim.
Nessa nossa pobre cultura reflexa, que, no entanto, tem e teve seus momentos de grandeza (...), o parnaso e o símbolo representaram especializações de conquistas do romantismo, no fundo, uma explosão de poesia (de vida) no coração da literatura.
As frígidas construções parnasianas (Bilac, Raimundo Correia) eram mal-assombradas (ou bem-assombradas?) pelos fantasmas de um superego saído das artes plásticas (quadros de uma exposição, retratos do artista enquanto pintor, escultor, arquiteto, ourives, artesão).
O simbolismo mudou de sentido: do olho para o ouvido.
Nunca foi tão funda a saudade da poesia pela música perdida quanto no simbolismo. (...)
O poeta simbolista é um músico. Músico de palavras, de sílabas, de vogais e consoantes. Seus poemas: baladas, sonatas, sinfonias.
Mas, no simbolismo, ao contrário de um Arnaut Daniel, a entrada da música implica uma destruição do 'significado'. O massacre dos sentidos pelos sons."

LEMINSKI, Paulo.  
Vida: Cruz e Sousa, Bashô, Jesus e Trotski - 4 biografias
São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

5 comentários:

  1. Leminsky trata no texto é a musicalidade presente na poesia simbolista, a qual foi perdida ainda nos tempos dos trovadores que, de maneira oral, utilizavam-se de recursos externos à linguagem verbal, de instrumentos musicais à belas gravuras, dessa musicalidade, nos séculos seguintes, mantemos as métricas e rimas. As aliterações, simbologia, melancolia e misticismo dos poemas de Cruz e Souza trazem de volta a musicalidade perdida da poesia, com olhar cético ao desenvolvimento acelerado ao devolvimento humano devolve sua forma original de Arte, assim como a pintura como a música.

    Velho

    Estás morto, estás velho, estás cansado!
    Como um suco de lágrimas pungidas
    Ei-las, as rugas, as indefinidas
    Noites do ser vencido e fatigado.

    [..] A cabeça pendida de fadiga,
    Sentes a morte taciturna e amiga,
    Que os teus nervosos círculos governa.
    Estás velho estás morto! Ó dor, delírio,
    Alma despedaçada de martírio
    Ó desespero da desgraça eterna.

    Em constrate a vívida Simbologia, subjetiva, intensa e melancólica temos a razão descritiva Parnasiana:

    Fragmentos de Vaso Chinês de Alberto de Oliveira (1857-1937)

    [...] Contador sobre o mármore luzidio,
    Entre um leque e o começo de um bordado.
    Fino artista chinês, enamorado,
    Nele pusera o coração doentio
    Em rubras flores de um sutil lavrado...
    [...] Que arte em pintá-la! A gente acaso vendo-a,
    Sentia um não sei quê com aquele chim
    De olhos cortados à feição de amêndoa.

    Vemos nestes dois exemplos as diferenças entre as escolas literárias que se consolidaram no mesmo período histórico. A prioridade dada a linguagem, a impessoalidade, exaltação à outras artes e um classicismo exagerado tem a técnica como objetivo em detrimento da musicalidade e do sentimento. Gabriel Monteiro Soares

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  2. O Simbolismo é uma estética literária do século XIX que se opõe à objetividade Parnasiana.Pode-se observar no Simbolismo uma revivescência romântica.No Brasil,o Simbolismo teve início no ano de 1893,com a publicação de duas obras de Cruz e Sousa:Missal(prosa) e Broquéis(poesia).O movimento simbolista na literatura brasileira teve força até o movimento modernista do começo da década de 1920.Paulo Leminski em sua biografia "Cruz e Sousa,o negro branco",não se deixa perder na conhecida linha dos estilos de época e reforçar o simbolismo do poeta negro,ele busca outras filiações,inspirado mais pela intuição que pela historiografia literária.Assim,Cruz e Sousa é apresentado como um poeta que chegou ao soneto porque não era americano.Sua poesia soturna permite a Leminski uma leitura afiada."Fosse negro norte-americano,Cruz e Sousa teria inventado o blues".Blues e Sousa.
    Cruz e Sousa é medido pela arte de Baudelaire,dos cantores de Spirituals,das grandes damas do blues.Leminski destaca seu erotismo,"uma linguagem em ereção".
    Para o biógrafo,com suas imagens profusas e aveludadas,Cruz e Sousa foi um poeta priápico,que se valia de uma musa ninfomaníaca,provavelmente lésbica,com furor uterino.Destacando:"uma musa,é claro,expressionista".Para confirmar sua leitura lança mão de teóricos como Edmund Wilson e Pierce,mais uma vez passando por cima da cronologia para fazer valer o sentido.O autor,ainda analisa a poesia de Cruz e Sousa em seu aspecto linguístico e musical,mostrando como por artes do Simbolismo,o sentido do poeta deixa o olho para habitar o ouvido.Cruz e Sousa,mais que poeta,foi um sonoplasta.A figura prevalente,na sua poesia,não é a aliteração,nem a harmonia imitativa,onomatopeia dos sentimentos,nem a ecolalia,mas o anagrama,afirma Leminski.
    O anagrama é a palavra dentro da palavra.Cruz e Sousa compunha "vendo,na luz de uma palavra,a outra luz de outra palavra".Trecho
    Poema Encarnação,autor:Cruz e Sousa: "Carnais,sejam carnais tantos desejos,/Carnais,sejam carnais tantos anseios,/Palpitações e frêmitos e enleios,/Dar harpas da emoção tantos arpejos.../Sonhos,que vão por trêmulos adejos,/A noite,ao luar,intumescer os seios/Lácteos,de finos e azulados veios/De virgindade,de pudor,de pejos..."
    Trecho poema A Cavalgada,autor Raimundo Correa: "A lua banha a solitária estrada.../Silêncio!...Mas além,confuso e brando,/O som longínquo vem-se aproximando/Do galopar de estranha cavalgada./São fidalgos que voltam da caçada;/Vêm alegres,vêm rindo,vêm cantando./E as tropas o soar vão agitando/O romanso da noite embalsamada..."
    Analisando esses dois poemas(sonetos) ao se fazer uma comparação entre o Simbolismo e o Parnasianismo pode-se perceber que ambos têm estruturas de 10 sílabas poéticas(decassílabos),o Simbolismo tende a ter uma poesia mais sugestiva,interior e que trata de temas humanos,enquanto o Parnasianismo é uma arte fechada no descritivismo sem grandes avanços filosóficos,emocionais.A poesia parnasiana tenta ser bela para ser bela (arte pela arte) sem um real objetivo,ou tema a ser discutido.No caso da poesia analisada é apenas a descrição de uma estrada onde passa uma tropa.Já o poema simbolista trata de um tema interior do homem (o desejo),ele passeia nesses desejos através de uma linguagem subjetiva e metafórica.
    Maurício Machado Gonçalves

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  3. O livro Vida de Paulo Leminski reproduz quatro biografias contadas de modo bem peculiar. Os biografados foram Cruz e Sousa, Bashô, Jesus e Trótski, todos personalidades marcantes. Na produção literária referida, Leminski descreve características do Simbolismo na produção de Cruz e Sousa, o notável poeta negro de Santa Catarina, considerado acima da média entre os poetas de sua época, que deu realce ao simbolismo no Brasil.
    Em nosso país, segundo Leminski, o simbolismo teve sua existência mais ou menos, de 1890 a 1920, ele foi underground, ou seja, atuou fora de grupos de indivíduos com poder e influência no campo da literatura da época, em que imperava o parnasianismo, com seus representantes como Bilac, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira.
    Na poesia de Cruz e Sousa as menções à musicalidade sobejam. Leminski se refere ao Filho de Guilhermes como um sonoplasta. Em sua poesia a linguagem é transverbal, transmite mensagens além das magias dos vocábulos. Exigindo do leitor, para compreendê-la, uma impressão extra-sensorial. O leitor se obriga a ler as entrelinhas e empregar seu sexto sentido.
    Na poesia O Assinalado, Cruz produz um dos mais notáveis “poema da loucura”, talvez por ter cuidado do período de loucura de sua amada esposa, Gavita, resumiu o experimento poético e loucura, num só tempo. Em poemas de Cruz há a presença do tachismo verbal, que são manchas, borrões semânticos que contraria a prosa medida e rimada do parnasianismo, marca literária da estabilidade da elite brasileira.
    Cruz e Souza marcou sua vida de escritor pela genialidade com as palavras, pela sensibilidade da poesia e a inquietação dos sentimentos.
    A seguir traço aproximações e distanciamentos entre as produções poéticas de Auta de Souza & Cruz e Sousa, com relação à estética simbolista.
    De Auta, seleciono estrofes do poema Ao Luar, do livro Horto (1899), e de Cruz, partes do poema Luar que está no livro póstumo, O livro derradeiro, que foi publicado em 1944.

    AO LUAR (Auta de Souza)
    A Maria Fausta e a Mercês Coelho
    Astros celestes, docemente louros,
    Giram no espaço, em luminoso bando;
    Ouve-se ao longe um violão plangente
    [...]
    As preces tristes de um magoado coro
    De almas penadas ao luar rezando.
    [ ...]
    Flocos de nuvens pela Esfera adejam,
    [...]
    De criancinhas, ao luar sonhando.

    LUAR (Cruz e Sousa)
    Pelas esferas, nuvens peregrinas,
    Brandas de toques, encaracoladas,
    Vão penumbrando as coisas cristalinas.
    [...]
    Rasga o silêncio a nota chã, plangente,
    Da Ave-Maria, — e então, nervosamente,
    Nuns inefáveis, espontâneos jorros.
    Os poemas utilizam como tema o ambiente formado pela luz da lua para retratar a manifestação do eu lírico. São produções textuais que abordam o exterior com relação à lua, refletindo sobre o homem voltado para dentro de si. O eu lírico manifestado nos poemas supracitados reflete a busca pela vida interior.
    Nas contemplações existentes nos poemas, há a que se refere à dor: Ao luar, de Auta de Souza, na seguinte frase: “n’um dolorido choro”, e em Luar, de Cruz e Sousa, “nuns inefáveis, espontâneos jorros”. Nos eu líricos citados está presente o choro como consequência da dor interior, na cena enluarada.
    Na expressão poética de Auta de Souza está presente uma oração de súplica: “As preces tristes de um magoado coro”, no de Dante Negro do Brasil, o indício da oração das seis da tarde: “Da Ave-Maria, - e então, nervosamente”. O momento sublime da dor sentida.
    Observando os textos, constata-se, também, o diálogo estabelecido na caracterização das nuvens, que em Ao luar encontramos em: “Flocos de nuvens pela Esfera adejam,” e em Luar: “Pelas esferas, nuvens peregrinas,”
    Os poemas que foram analisados estão adequados à estética do Simbolismo, por exemplo, pela experiência espiritualista, presentes nos textos “Ao luar”, de Auta de Souza, e “Luar”, de Cruz e Sousa. Uma tendência expressiva bastante empregada pelos poetas que labutam com a estética simbolista.

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  4. Leminski, no texto do post, defende que o poeta simbolista é um músico, e na obra de Cruz e Souza, posso perceber isso, pois ao ser lida em voz alta pude perceber a musicalidade presente no poema. Neste comentário utilizarei o seguinte poema:
    Alma solitária (Cruz e Souza)

    Ó Alma doce e triste e palpitante!
    que cítaras soluçam solitárias
    pelas Regiões longínquas, visionárias
    do teu Sonho secreto e fascinante!

    Quantas zonas de luz purificante,
    quantos silêncios, quantas sombras várias
    de esferas imortais, imaginárias,
    falam contigo, ó Alma cativante!

    que chama acende os teus faróis noturnos
    e veste os teus mistérios taciturnos
    dos esplendores do arco de aliança?

    Por que és assim, melancolicamente,
    como um arcanjo infante, adolescente,
    esquecido nos vales da Esperança?!
    Todo o poema tem rimas, uma característica do autor, que auxilia na produção do seu sentido e na riqueza de sua composição.
    Relacionei esse poema com o de Casimiro de Abreu “A Valsa”, do período do romantismo.
    Trecho:
    A valsa



    Tu, ontem,

    Na dança

    Que cansa,

    Voavas

    Co’as faces

    Em rosas

    Formosas

    De vivo,

    Lascivo

    Carmim;

    Na valsa

    Tão falsa,

    Corrias,

    Fugias,

    Ardente,

    Contente,

    Tranqüila,

    Serena,

    Sem pena

    De mim!

    Quem dera

    Que sintas

    As dores

    De amores

    Que louco

    Senti!

    Quem dera

    Que sintas!…

    — Não negues,

    Não mintas…

    — Eu vi!…
    Nas duas obras a musicalidade, as rimas estão presentes, apesar de serem de períodos diferentes, elas possuem essa característica em comum. Enquanto Casimiro relata um momento de valsa e de amor pela personagem. Cruz e Souza aborda, no poema utilizado, a solidão, vai além de um romance idealizado, ele retrata a dor da realidade em forma de poema/música.
    Raquel Portella de Souza

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  5. João de Cruz e Souza é considerado o precursor do Simbolismo no Brasil, sendo chamado de “Dante Negro’’ pelo escritor italiano Dante Alighieri, as obras de Cruz e Souza não são somente marcadas pelo musicalidade, mas também pelo subjetivismo, individualismo, pessimismo, misticismo e espiritualidade. O autor trabalhou a questão do amor, o sofrimento, a sensualidade, a morte, a religião, além de temas associados ao abolicionismo.
    Como é comum na literatura, a vida e a obra confundem-se na história de um escritor.

    Foi um homem que experimentou toda a força de sua existência - angustiada e obscura - projetando-a numa escrita reveladora dos dramas sociais da época. No poema Da Senzala vemos como o escritor usou a musicalidade na composição de cada rima, os horrores cometidos fazem com que o homem perca a razão, ele não se calou com a sociedade do seu tempo.

    Aprendeu a viver naquele Brasil tanto como homem, tanto como artista, Os poemas de Cruz e Sousa abandonam o significado explícito e lógico para buscar a ilogicidade e a sugestão vaga, regras, aliás, de fundamental importância para a poética simbolista.

    "De dentro da senzala escura e lamacenta
    Aonde o infeliz
    De lágrimas em fel, de ódio se alimenta
    Tornando meretriz

    A alma que ele tinha, ovante, imaculada
    Alegre e sem rancor,
    Porém que foi aos poucos sendo transformada
    Aos vivos do estertor...

    De dentro da senzala
    Aonde o crime é rei, e a dor - crânios abala
    Em ímpeto ferino;

    Não pode sair, não,
    Um homem de trabalho, um senso, uma razão...
    e sim um assassino!"

    Evandro Moreira Quevedo

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